Título: Vergonha
Autora: Brittainy C. Cherry
Editora: Record
Ano: 2019
Páginas: 410
Sinopse: Um amor inesperado que surge de forma inusitada e arrebata a vida de Grace Harris. Grace Harris está perdida e sozinha em sua casa em Atlanta depois que o homem que ela pensou que ficaria a seu lado pelo resto da vida traiu sua confiança, partiu seu coração e saiu de casa, deixando seu casamento em suspenso. Grace resolve, então, passar o verão com a família em Chester, sua cidade natal, para respirar, dar um tempo de tudo. Sua vida está uma bagunça e o que ela precisa no momento é de um pouco de gentileza e compaixão.
Por incrível que pareça, Grace encontra isso na pessoa mais improvável de todas: Jackson Emery, a ovelha negra da cidade. Conhecido como a erva daninha de Chester, ele é sinônimo de encrenca, e não faz nada para mudar essa imagem. Tendo perdido na infância o que havia de mais valioso na vida, Jackson se tornou um homem amargurado e não dá a mínima para o que pensam dele. Os caminhos de Grace e Jackson acabam se cruzando de um jeito inusitado e a tristeza profunda que carregam atrai os dois como ímã. Ambos sabem que não foram feitos um para o outro, mas, como tudo vai acabar mesmo com o fim do verão, resolvem deixar rolar e se entregar a uma diversão passageira.
Porém, o que Grace não imaginava é que seu coração, já destroçado, seria obrigado a aprender que certos relacionamentos são capazes de causar dores muito profundas, e que é sempre preciso fazer uma escolha.
Vergonha, da Brittainy C. Cherry, foi o primeiro livro que terminei em 2023. Hesitei um pouco em publicar uma resenha aqui no blog e já fiz algumas reflexões no meu perfil do Instagram, que deixei salvas nos destaques. Mas, de alguma forma, mesmo que eu tenha gostado do livro, no geral, em respeito ao público que me lê aqui e lá, acho que é mais responsável fazer algumas observações sobre a obra, no geral e destacar alguns detalhes. Aqui no blog, será melhor por não ter a limitação de caracteres dos posts do feed do Instagram e nem preciso resumir tanto como em um story. Bem, vamos lá.
Vergonha é um livro do gênero romance dramático, embora a capa leve a pensar que o conteúdo seja erótico ou até um new adult. Como eu já conhecia o estilo da autora, quando minha amiga recomendou a leitura, não me concentrei nesse detalhe e fui logo começar a ler.
A protagonista é Grace, uma filha de pastor, que começa a história vendo seu casamento desmoronar por uma traição de seu marido, Finn. Ela vai passar o verão em Chester, onde mora sua família e é lá que toda a trama se desenrola. Chester é uma cidadezinha pequena e, como tal, a maioria das pessoas sabe tudo da vida umas das outras. A fofoca rola solta, a família “dona” da igreja é considerada a realeza da cidade e as filhas do pastor consideradas as princesinhas perfeitas.
Na periferia disso, vive Jackson, um rapaz de 24 anos, que trabalha em uma oficina mecânica e cuida do pai alcoólatra. Ele começa a história vendo o casamento dos pais acabar e seu único amigo, o cachorro Tucker como suporte.
Enquanto Grace cresceu com uma aparente vida boa, cresceu sem decidir seus próprios caminhos. Engolida pelo estilo de vida de Chester e da reputação familiar que precisava manter, não sabe muito sobre si mesma e seus gostos. Quando seu casamento acaba, sente-se perdida, sem saber o que fazer e, ainda pior, quem ela é. Tudo isso piora quando, ao invés de receber apoio e acolhimento das pessoas de quem mais se esperaria isso, tanto sua mãe quanto a igreja a pressionam a aceitar o inaceitável e a lutar pelo que já nem existe mais. No boca a boca, Grace ai sendo mal falada e objeto de fofoca, provocando a ira de sua mãe, que vê a reputação da família ir pelo ralo.
Tudo isso ainda piora quando, em vários momentos, quem está na cena para salvar Grace do desespero é Jackson, que se tornou a ovelha negra da cidade, aquele para quem ninguém olha e com quem ninguém quer ser visto. Encontramos Jackson crescido, tendo perdido a mãe e sendo responsável por manter o pai vivo e a oficina dele funcionando, de onde vem o sustento dos dois. Jackson teve que abandonar sonhos e fazer o que se devia, desde muito pequeno. Forçado a amadurecer antes da hora, desprezado pela cidade inteira e considerado um monstro pela igreja e a família que a comanda, a última coisa que ele quer é contato com a princesa Grace.
Mas, não é isso que o destino parece querer e, vez após vez, os dois se encontram, até que passam a um tipo de relacionamento que “serve” aos dois. Jackson é o bad boy da cidade, que trocou o vício em drogas pelo “sexo para esquecer” e Grace é a mocinha perfeitinha que decide se rebelar. O relacionamento dos dois começa como pura troca física e, apesar da capa levar a crer que se trate de um livro com uma carga de sexo muito grande, os personagens mais FALAM sobre o assunto do que existem cenas realmente gráficas de sexo. Ainda assim, não recomendo para menores de idade.
Em resumo, esta é a história até a parte onde os conflitos começam e todos os dramas passam a desenrolar. Não costumo dar spoilers em minhas resenhas, nem ficar só no resumo básico da trama (senão não seria resenha), então coloco aqui algumas observações que acho importantes sobre a história em geral.
Eu gosto muito da escrita da autora e com Vergonha não foi muito diferente. O texto é fluido, os diálogos são dinâmicos e importantes e os capítulos são construídos de uma forma que não dá para simplesmente deixar o livro de lado. Eu só não devorei a história toda em dois dias porque minhas pequenas férias já acabaram e eu tinha muito trabalho. Como toda história da Brittainy, os dramas são a principal carga da história.
Nesse, como em Eleanor & Grey, trata-se de um universo mais adulto do que jovem. Talvez seja por isso que estranhei um pouco as escolhas dos livros que os personagens liam em algumas cenas na livraria. Pelo estilo de vida deles e as faixas etárias, eu imaginaria que eles lessem outras obras. Mas, também não é nada que eu não faça, afinal, olha a minha idade e os livros que eu gosto de ler. E os textos que eu gosto de escrever. Então, tudo bem.
Mas, ainda na livraria, um ponto que me deixou pensativa foi que os dois, Jackson e Grace, se refugiavam na livraria para ler por horas intermináveis. Cada um por seus motivos, mas o que eu quero dizer é que, no livro, as leituras deles e as conversas que surgem a partir disso são o ponto de contato que os permite começar a adentrar a vida um do outro, a saber o que eles pensam, do que gostam e como reagem na vida.
Apesar de se entregarem ao sexo o tempo todo, no livro o sexo é jogado de lado, como uma mera troca física, sem importância e que, sem dizer isso, mas deixando no ar, pode ser feita com qualquer um, por qualquer motivo, porque não é importante. Como cristã, meu posicionamento é bem diferente. Entendo que o sexo é importante, que tem seu lugar dentro do casamento e que não é só algo que se resuma ao aspecto físico e corporal. No livro, a banalização é tanta que apesar de todas as vezes em que o casal transa, a aproximação, carinho, vínculo só se forma quando eles se concentram em outras atividades, como por exemplo a livraria.
Toda a trajetória do livro, especialmente na vida do Jackson, é desenhada para mostrar uma pessoa buscando a libertação e a paz para si mesma, mas na obra, tudo acontece na direção errada e pelos motivos errados, se considerarmos a forma cristã de enxergar a realidade. Primeiro ele tenta encontrar seu refúgio nas drogas. Depois, para não usar a droga, ele sai fazendo sexo com qualquer uma da cidade. Depois, só com Grace e, ao mesmo tempo em que tenta se encontrar nela, a solução para sua libertação no livro está dentro dele mesmo. Acontece algo parecido com Grace.
Como cristã, isso me chama a atenção, pois a condição humana é tal que não dá para encontrar a salvação em nenhuma dessas coisas que os personagens buscaram. Muito menos dentro deles mesmos. A individualidade e a busca interior não são a solução para os problemas do pecado da humanidade. Cristo é. Não é se enfiando em uma busca desenfreada por nós mesmos que vamos encontrar as respostas. O ser humano não pode salvar a si mesmo.
No livro, o caminho retratado é esse da busca por si, mas agravada por algo que também me deixou pensativa e ainda mais triste. Os dois buscam apoio da igreja e dão com a cara na porta. Na verdade, dão com a porta na cara deles. Tudo o que os dois personagens encontram ao ir atrás da igreja e da família do pastor é julgamento, zombaria, regras a serem seguidas. A comunidade cristã retratada no livro joga na cara dos dois personagens que já estão na lama que a condição deles é péssima, que a presença deles ali “estraga a bela paisagem” e, algumas vezes de forma explícita, outras de forma sutil, são convidados a se manterem à distância.
Esse ponto acabou comigo de diversas formas. Primeiro, porque eu cresci na igreja e vi muito isso acontecer, de todos os lados dessa moeda. Já perdi as contas de quanta gente vi deixar a igreja porque não era aceita, não era acolhida ali dentro, onde se diz um lugar de acolhimento e de sarar feridas. Quantas vezes, eu mesma e muitas pessoas que eu conheço, acharam mais abraços e colo entre pessoas que não são da igreja? E posso falar? Os amigos mais chegados da minha família hoje são os que cresceram com o meu marido. Nenhum é da igreja. Não acho bonito ver cristãos sendo retratados daquela forma no livro, mas não posso negar que essa seja a realidade da igreja hoje.
Me faz chorar quando penso que essa é a imagem que passamos ao mundo. Que a imagem que as pessoas hoje tem de nós é de um bando de malucos, estúpidos, fanáticos, fofoqueiros e preconceituosos, que dão as costas ao necessitado (e aqui não estou falando de pobre só não). Fico pedindo pela misericórdia do Senhor pelo que temos feito ao invés de dar testemunho dele, como nos foi ordenado há milênios.
Vergonha é um livro que eu recomendo com ressalvas, por conta da capa e da questão do sexo, mas de cuja leitura gostei, por tudo que me fez pensar.
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