Publicado em Reflexões, Saúde

Setembro Amarelo – Depressão

Como eu havia comentado em um post anterior, hoje quero comentar alguma coisa sobre a depressão, em continuidade à campanha do Setembro Amarelo, pela prevenção do suicídio. Alguns, que me acompanham mais de perto sabe que eu passei por um período meio tenebroso em 2014 e parte de 2015, quando fui diagnosticada com depressão e ansiedade em razão do stress no trabalho. Mas, como mesmo essas pessoas não sabem tudo o que se passou nessa cabecinha aqui, resolvi aproveitar o embalo da campanha e falar um pouco sobre o que me aconteceu. Quem sabe isso estimula outras pessoas a falarem sobre suas experiências e também ajudarem outras pessoas, numa corrente do bem contra esse mal?

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A depressão ainda é um tabu. Dificilmente, quem não estuda o assunto ou quem não passa por ele não tem a exata noção do que acontece com alguém que sofre da doença e, pra piorar, não sabe muito como lidar com essas pessoas, podendo, numa tentativa desesperada de ajudar, acabar afundando a pessoa ainda mais no seu desespero.

Eu era uma dessas pessoas, que igualava tristeza e depressão, colocava tudo dentro do mesmo saco e era capaz de pensar “Poxa, mas essa pessoa tem tudo, por que só fica triste?”. Infelizmente, eu acabei experimentando na pele o que é sentir algo que ninguém entende e que eu também não conseguia explicar. Eu já tinha essa experiência de “incompreensão” por conta da fibromialgia, já que tanto alguns médicos quanto pessoas que conheço relacionam as dores e a fadiga quase constante que eu sinto com preguiça, moleza ou frescura. Durante u tempo eu tentei até brigar e me explicar, mas isso dificilmente era bem-sucedido, então, hoje eu me limito a usar uma fila de palavras técnicas que chocam um pouco e a pessoa pensa “ah, tá, é doença”. Com a depressão não foi diferente.

Não sei quando começou. Sempre tive uma tendência à melancolia. Isso se reflete até em algumas coisas que tento escrever, em minha personalidade mais introspectiva, meus hobbies nada sociais e uma tendência ao isolamento. Não acho que nada disso sejam sintomas da depressão, mas não sou médica, sou paciente, então, minha opinião aqui é só quanto ao que eu sinto mesmo. Mas pode ser que por ser assim, eu tenha sido uma presa mais fácil pra depressão.

Junte-se a isso, um ambiente de trabalho hostil, com um superior que incitava a competição desnecessária entre os colegas, a pressão por desempenho acima dos níveis humanos de tolerância, um chefe que berrava com os funcionários até mesmo diante de clientes e que debochava diante dos erros. Além disso, havia a hostilidade entre colegas, que achavam que eu queria lhes puxar o tapete, ao compartilhar a mesma função ou outros que estimulavam esse tipo de sentimento, por meio de fofocas, provocando meu isolamento até das atividades extra-escritório. Em uma situação financeira pessoal difícil e uma situação econômica desfavorável no país, somando-se ao fato de pelo tempo de contrato ser praticamente impossível encontrar um salário semelhante em outro lugar, virei uma panela de pressão e fui parar no consultório do médico, entupida de remédios e em frangalhos.

Porém, até que isso chegasse ao extremo do afastamento e posterior demissão (libertação), eu comecei a desmoronar por dentro. Não conseguia enxergar uma saída pra situação com as tais colegas que me prejudicavam até com o convívio social com os demais, com os superiores não havia – tanto – espaço para dizer o que eles não gostariam de ouvir, nem o menor interesse em cooperar para que a situação melhorasse. Mas mais do que ficar contando e relembrando o que levou a tudo isso, o foco aqui é mostrar como as pessoas lidaram com essa situação.

Cansei de ouvir que eu precisava sorrir, que eu não podia me entregar, que eu precisava ser forte… Gente, pelo amor que vocês tem em vocês mesmos, parem de falar besteiras. Eu queria morrer quando as pessoas vinham me falar que eu tinha milhares de motivos pra ser feliz, que todo emprego seria a mesma porcaria, que eu estava melhor que muita gente. Sério, pessoal. Isso não ajuda em nada.

Eu vivi quase dois anos só chorando? Claro que não. Eu tinha muitos momentos de descontração, mas isso não mudava a situação global em que eu estava enfiada até o último fio de cabelo. Sair com os amigos, beber, dar risada, compartilhar bobeiras do twitter não eram um sinal de que o conselho dessa gente tinha dado certo e que eu enfim estava melhorando. Vocês acham que o humor negro saiu de onde? De ver o lado cômico da desgraça, mas a desgraça está ali e por mais que estejamos rindo, ELA ESTÁ ALI. Por isso que tanta gente acaba comentando: “Mas, Fulano??? Nunca imaginei que ele tivesse depressão! Sempre tão pra cima!!” Pois é.

Quando me diziam que eu tinha que ser forte eu tinha vontade de pegar o mundo inteiro que estava desabando na minha cabeça e jogar em cima dessas pessoas, pra ver se todas elas juntas dariam conta de segurar o que eu estava enfrentando sozinha. Eu já estava sendo forte, eu já estava usando todas as minhas forças existentes nesse organismo aqui pra tirar as cobertas de cima de mim, levantar da cama de manhã e me arrastar seja pro trabalho, enquanto ainda estava lá, seja pra qualquer compromisso com a minha mãe, quando ela sabiamente não me deixou passar mais do que algumas horas sozinha em casa durante meus dias mais difíceis.

Tudo o que poderia ser considerado forças já estava esgotado em simplesmente ficar de pé e qualquer esforço extra que me exigissem era capaz de me fazer desabar imediatamente. Por isso, se você está diante de alguém que está em frangalhos, saiba que aquilo é toda a força que aquela pessoa tem. Exigir mais é provocar mais sofrimento.

Tá, mas e aí? Bem, não pensei em me suicidar, mas não acharia nenhum absurdo se o teto desabasse sobre a minha cabeça, se eu fosse atropelada por um caminhão, atacada por um pit bull ou algo assim. Entende? Ao mesmo tempo em que algo dos meus princípios ficou intacto e não me permitiu atentar contra a minha vida, isso não me impediu de descuidar de mim mesma e de cometer excessos, nem de deixar de me importar caso algo me acontecesse.

Ao longo do processo, tive acompanhamento de psiquiatra e psicólogo e o suporte da família e de alguns amigos. Foi difícil? Pra caramba. Tanto pelos efeitos do remédio, que não eram sempre os melhores, como pelo processo terapêutico de lidar com tanta coisa que eu precisava, na terapia. Mas isso só teve o efeito rápido que teve – um ano, mais ou menos, até eu deixar os tratamentos e me sentir oficialmente preparada para enfrentar o mundo de novo – porque eu tive o apoio de pessoas que souberam ouvir o que eu tinha a dizer, fizesse ou não sentido para elas, sem tentar me dar uma solução enlatada para o que eu estava passando.

O melhor de ter contado com esse apoio foi não precisar me explicar, poder chorar quando necessário, poder ficar em silêncio e saber que havia pra onde correr. Eu ainda lido com a depressão. Isso não é uma gripe que dura uma semana e vai embora. infelizmente eu tenho que ficar atenta constantemente, alerta para os sintomas, para os gatilhos que poderiam me fazer descer aquela espiral de dor e sofrimento novamente. Mas hoje eu me respeito muito mais.

Respeito meus limites quando diante de uma rejeição, sei preservar quem eu sou e não me humilho mais para ser aceita no grupo. Às vezes, sair é a melhor forma de preservar a própria integridade e alguma amizade.

Respeito meu sono quando ele vem descontrolado, mas não me deixo hibernar mais, como forma de fugir das responsabilidades. Respeito meus limites quando faço apenas os exercícios que aguento na academia, sem me acomodar e não avançar os limites que eu sei que consigo.

Respeito minha integridade mental, quando não me submeto gratuitamente a reuniões de família em que haverá mais pressão psicológica do que uma comunhão fraternal, mesmo não tendo deixado de amar ninguém, mesmo à distância. Aprendi que é mais importante cuidar de mim primeiro, para depois dar conta de cuidar de outros.

Por isso, se você tem que lidar com alguém que está enfrentando a depressão, por favor, seja um apoio, seja a ajuda que a pessoa precisa e não simplesmente uma ajuda que vá limpar a sua própria consciência de pelo menos ter feito algo. Seja alguém com quem o doente possa contar, mas não tente fazê-lo seguir seu exemplo de sucesso, sua fórmula mágica. Aponte caminhos, mas esteja disposto a andar de braços dados com essa pessoa, no ritmo dela, até a solução do problema. Deixe chorar, deixe falar, deixe calar. Dê chocolates, dê apoio e não encha o saco. Simplesmente esteja ali. Talvez assim, a pessoa se sinta mais à vontade pra ser ajudada por você.

Quando três amigos de Jó, Elifaz, de Temã, Bildade, de Suá, e Zofar, de Naamate, souberam de todos os males que o haviam atingido, saíram, cada um da sua região, e combinaram encontrar-se para mostrar solidariedade a Jó e consolá-lo. Quando o viram à distância, mal puderam reconhecê-lo e começaram a chorar em alta voz. Cada um deles rasgou o manto e colocou terra sobre a cabeça. Depois se assentaram no chão com ele, durante sete dias e sete noites. Ninguém lhe disse uma palavra, pois viam como era grande o seu sofrimento. – Jó 2:11-13

Se você escreveu algum post no seu blog com o relato de sua luta com a depressão, pode colocar o link preenchendo o formulário abaixo. Vamos colaborar para a conscientização sobre a depressão!